domingo, 10 de novembro de 2013

Platão - Parte I: Uma Releitura Moderna



Platão - Parte I
Uma Releitura Moderna


Prefácio: Este trabalho e pesquisa de Carlos Leite Ribeiro - Marinha Grande - Portugal, realizado com muito amor à arte e fidelidade à História, nos apresenta um pouco da filosofia de Platão e sua história, tendo em vista as considerações de Platão sobre pontos tão diversos, importantes e relevantes para nossa vida atual, como: significado da vida, política, corrupção, violência, justiça, existência da alma, a criação do mundo, interpretação do visível e do invisível presentes em nossa existência e por último uma grande lição de como devemos estar abertos para mudanças, e, principalmente assumir as consequências ao visualizar, aprender e conquistas novos horizontes. Aconselho a todos, estudantes ou curiosos a se deleitarem com as belezas deste texto, tão magnificamente escrito pelo Mestre Carlos Leite Ribeiro.

Dermeval Neves 

Platão e sua Filosofia

Platão, filósofo grego, teria nascido em Atenas em 427 antes de Cristo. Com 20 anos, teria conhecido Sócrates, vivendo junto dele oito anos para iniciar-se em Filosofia.

Nascido duma família ilustre, sentiu provavelmente o problema das relações entre a Filosofia, a Justiça e a Política, por ocasião de condenação de seu mestre. Viajou muito: Grécia, Egito, Cirene, Itália do Sul (onde travou conhecimento com o pitagórico Arquitas, que havia instaurado em Tarento um governo cujos princípios se baseavam na filosofia), Siracusa (a convite do tirano Dionísio, o “Velho”, que o expulsou e, depois de Dionísio, o “Jovem”, que garantiu a sua permanência). Em 387 antes de Cristo, fundou em Atenas a Academia, que tinha na fachada a seguinte exigência: “Que por aqui não entre quem não for geômetra”.

A Obra de Platão conta com 28 diálogos considerados autênticos. Antes de viajar, compôs diálogos nos quais coloca Sócrates em cena e esforça-se por definir noções como a mentira (Hípias menor), o dever (Crifton), a natureza humana (Arcibíades), a sabedoria (Cármides), a coragem (Lagues), a amizade (lisis), a piedade (Eutifron), a retórica (Górgias), Protágoras). Entre 387 a 361 antes de Cristo, escreveu Menexeno, Menon (Da virtude), Eutidemo (Da erística), Crátilo (Da justeza dos nomes), O banquete (Do amor), Fédon, A república (Da justiça), Fedro, Hétero (Da ciência) e Parménides. Os diálogos da maturidade são O sofista (do ser), A política, Timeu Da natureza), Crítias (A Atlântida), Filebo (Do prazer) e As leis.


Podemos considerar Platão (427 – 347 antes de Cristo) como aquele que mais detalhou as principais ideias socráticas. É especialmente por meio de Platão que podemos conhecer Sócrates e é na superação do desafio que a obra do mestre representou para ele que devemos entender aquela que é característica fundamental do trabalho platônico.

Quando Sócrates convence Alcebíades da inadequação da vida pública enquanto não fosse alcançado um nível satisfatório de auto conhecimento, coloca explícito aquilo que era fonte de sua grande perplexidade, finalmente ultrapassada por Platão.

Segundo Cornfor, estudioso da obra desse pensador, “Platão deve ter reconhecido que a concepção socrática do significado e finalidade da vida cavara um abismo a seus pés. Em parte, os diálogos socráticos foram escritos para iluminar o seu próprio espírito, antes de decidir se poderia aderir verdadeiramente à filosofia e servir também Atenas como um ativo homem de estado”.

O pensamento político de Platão pode ser entendido de várias formas: como relação entre a virtude e a moral, vinculando a moral dos governantes e a qualidade da ação política; como relação entre a ciência da política (saber teórico) e o direito de governar (entendendo aí a política como uma prática daqueles que possuem o senso de justiça e que procuram o bem estar comum); como ideia de remédio para controlar ou combater a corrupção política.

Para Platão, a violência e justiça ocorriam especialmente por conta de dois instrumentos: a força física e a palavra. Nesse sentido, o combate se dá através do isolamento da mentira e dissimulações que ocorrem por meio do uso da linguagem. Com a dialéctica, não se usa da palavra para lutar e vencer aquele que tem o maior poder de argumentação. A discussão tem como objectivo a produção de contradições para que, através delas, seja possível se reconhecer a própria ignorância.

Também é fundamental a retomada e a releitura que Platão faz do pensamento de Heráclito e Parmênides. Se para Heráclito não havia um sujeito que se pudesse conhecer, tampouco um objeto que pudesse ser conhecido (já que o fluxo perene de todas coisas impedia o exercício do pensamento na busca da essência), para Platão o engano consistia em considerar que o devir alcançava toda a totalidade do real. Para Platão, o devir é apenas a marca do mundo sensível, do mundo das coisas materiais e corpóreas, que nascem, se transformam e se corrompem. Dessa forma, o devir é a marca do mundo das aparências, do que é percebido pelos nossos sentidos.

Esse pensamento também responde às indagações de Parmênides. Platão “mata” o pai Parmênides, admitindo a existência do Não-Ser, e alça o conhecimento – por meio da dialéctica – o método e instrumento para passarmos do sensível ao inteligível, do visível ao invisível.

Ainda, elabora a sua teoria a respeito dos modos de conhecimento, admitindo que eles são vários e que partem da sensação e percepção e se movimentam no sentido de alcançar a essência, inteligível. Para Platão, existem os meios de adquirir conhecimento (o nome, a definição e a imagem) e existe o conhecimento propriamente dito, que resulta de uma operação do pensamento. A “fricção” entre essas quatro formas nos conduz ao quinto modo, aspiração da nossa alma em busca do saber e do conhecimento.

Platão cria os mitos e os utiliza nos seus Diálogos, exercitando o pensamento como forma resultado da discussão e usando a dialéctica como método de conhecimento. O mito de Timeu é o mito sobre as idades do mundo e, através dele, Platão nos mostra que o mundo é resultado da mistura de duas realidades diferentes: a dos seres imutáveis, invisíveis aos sentidos e visíveis para o intelecto: o mundo das ideias; a outra realidade, a dos sujeitos ao devir, ao nascimento e perecimento, visíveis aos sentidos e ao intelecto.

Recontando o mito da criação do mundo, Platão nos apresenta à sua cosmologia, relacionando a moralidade da sociedade ideal com as formas estruturais do mundo, com a fundação da própria ordem do Universo.  O mundo é um cosmo, possuidor de uma alma que é fonte do conhecimento. No princípio, havia uma única alma universal e a partir dela surgiram as almas dos homens e dos deuses.

A alma humana é a natureza intermediária entre o divino e o mundo, entre o sensível e o inteligível e exerce funções que são independentes entre si:
a) a conservação do corpo (“entre o diafragma e o umbigo”), que é irracional e mortal;
b) a proteção do corpo (“acima do diafragma na cavidade do peito”), igualmente irracional e mortal;
c) a busca do conhecimento (“face e cérebro”), que é parte espiritual e imortal.

Ao trabalhar a questão da imortalidade da alma em vários escritos, Platão apresenta o que considera provas da imortalidade da alma: a recordação ou lembrança da verdade pressupõe que a alma tenha tido alguma existência em outra vida; se a alma é constituída de ideias, não pode se corromper ou desfazer; considerando-se a imutabilidade do incorpóreo, a alma não pode sofrer transformação; se a alma é o princípio de tudo, não pode participar do contrário à sua ideia, que é a morte; se a alma move-se sozinha, seu movimento não cessa.

Finalmente, a alma está destinada à “roda dos nascimentos” para que possa se libertar dos vícios e das paixões, realizando o que está destinada por natureza (a busca do conhecimento e a virtude).

Não à toa, Platão é tido como o filósofo que desenvolveu uma teoria sobre a alma. Portanto, imprescindível conhecer seu trabalho se pretendermos a compreensão da alma para a cultura grega.

Ivy Judensnaider

Platão em Formação

Inicialmente, Platão parece ter sido discípulo de Crátilo, seguidor de Heráclito, um dos grandes filósofos pré-Socráticos. Posteriormente, Platão entra em contanto com Sócrates, tornando-se seu discípulo, com aproximadamente vinte anos de idade e com o objectivo de se preparar melhor para a vida política. Mas os acontecimentos acabariam por orientar sua vida para a filosofia como a finalidade de sua vida.

Platão tinha cerca de vinte e nove anos quando Sócrates foi condenado à beber o cálice de cicuta (veneno fortíssimo). Ele havia acompanhado de perto o processo de seu mestre, e o relata na Apologia de Sócrates. O fato de Atenas, a mais iluminada das cidades-estados gregas, ter condenado à morte "o mais sábio e o mais justo dos homens" - como falara mediunicamente o oráculo de Apolo, em Delfos - lhe deixou marcas profundas que determinariam as linhas mestras de toda a sua atividade de filósofo.

Acredita-se que todas, ou uma boa parte da obra de Platão nos chegou inteira. Além de cartas e da Apologia de Sócrates, Platão escreveu cerca de trinta Diálogos que têm sempre invariavelmente Sócrates como protagonista.

Nestas obras excepcionais, Platão tenta reproduzir a magia do diálogo socrático, imitando o jogo de perguntas e respostas, com todos os meandros da dúvida, com as fugazes e imprevistas revelações que impulsionam para a verdade, sem, contudo, revela-la de modo direto.

O motivo pelo qual sua obra nos chegou praticamente intacta reside no fato de Platão ter fundado uma escola que se tornou famosa, e que era dedicada ao herói Academos. Daí o nome Academia.

Platão foi o responsável pela formulação de uma nova ciência, ou, para ser mais exato, de uma nova maneira de pensar e perceber o mundo. Este ponto fundamental consiste na descoberta de uma realidade causal supersensível, não material, antes apenas esboçada e não muito bem delineada por alguns filósofos, embora tenha sido um pouco mais burilada por Sócrates.

Antes de Sócrates, era comum tentar-se explicar os fenômenos naturais a partir de causas físicas e mecânicas. Platão observa que Anaxágoras, um dos pré-socráticos, tinha atinado para a necessidade de introduzir uma Inteligência universal para conseguir explicar o porquê das coisas, mas não soube levar muito adiante esta sua intuição, continuando a atribuir peso preponderante às causas físicas.

Entretanto, se perguntava Platão, será que as causas de carácter físico e mecânico representam as "verdadeiras causas" ou, ao contrário, representam simples "concausas", ou seja, causas a serviço de causas mais elevadas? Não seria o visível fruto de algo mais subtil?

Para encontrar a resposta às suas dúvidas, Platão empreendeu aquilo que chamou simbolicamente de "a segunda navegação". A primeira navegação seria o percurso da filosofia naturalista. A segunda navegação seria a orientação metafísica de uma filosofia espiritualista, do inteligível. O sentido do que seja essa segunda navegação fica claro nos exemplos dados pelo próprio Platão.

Se se deseja explicar por que uma coisa é bela, um materialista diria que os elementos físicos como o volume, a cor e o recorte são bem proporcionais e causam sensações prazerosas e agradáveis aos sentidos. Já Platão diria que tudo isso seria apenas qualidades que evocariam uma lembrança de algo ainda mais belo, vista pela alma no plano espiritual, mas que não está acessível ao plano físico. O objeto seria apenas uma cópia imperfeita, por ser material, de uma "Ideia" ou forma pura do belo em si.

Vejamos um outro exemplo: Sócrates está preso, aguardando a sua condenação. Por que está preso?

A explicação mecanicista diria que é porque Sócrates possui um corpo corpulento, composto de ossos e nervos, etc, que lhes possibilitam e lhe permitiram locomover-se e se deslocar por toda a vida, até que, por ter cometido algum erro, tenha-se dirigido à prisão, onde lhe sejam postas as amarras.

Ora, qualquer pessoa sabe a simplificação desse tipo de argumento, mas é justamente assim que falam os materialistas-mecanicistas até os dias de hoje. Mas este tipo de explicação não oferece o verdadeiro "porquê", a razão pela qual Sócrates está preso, explicando apenas o meio pelo qual pode uma pessoa ser posta num cárcere devido ao seu corpo. Explica o ato, descrevendo-o, e não suas causas.

A verdadeira causa pela qual Sócrates foi preso não é de ordem mecânica e material, mas de ordem superior, da mesma forma que um computador não executa um complexo cálculo matemático pela ação de seus componentes em si, mas devido a algo de ordem superior e mais abstrato: o seu programa, o software.

Sócrates foi condenado devido a um julgamento de valor moral usado a pretexto de justiça para encobrir ressentimentos e manobras políticas das pessoas que o odiavam. Ele, Sócrates, decidiu acatar o veredicto dos juízes e submeter-se à lei de Atenas, por acreditar que isso era o correto e o conveniente, pois ele era cidadão de Atenas, mesmo ciente da injustiça de sua condenação. E, em consequência disto, dessa escolha de ordem moral e espiritual, ele, em seguida, moveu os músculos e as pernas e se dirigiu ao cárcere, onde se deixou ficar prisioneiro.

A segunda navegação, portanto, leva ao conhecimento de dois níveis ou planos do ser: um, fenomenal e visível (a nível do hardware, como diríamos em linguagem de computação); outro, invisível e meta-fenomênico, (a nível do software), inteligível e compreensível pela razão e pela intuição.

Podemos afirmar, como falam Reale & Antiseri, que a segunda navegação platônica constitui uma conquista e assinala, ao mesmo tempo, a fundação e a etapa mais importante da história da metafísica.

Todo o pensamento ocidental seria condicionado definitivamente por essa "distinção" entre o físico (o hardware) e o causal (o software, a ordem implicada que causa a ordem explicada), tanto na medida da sua aceitação quanto de sua não aceitação através da história. Se ela não é aceita, a pessoa que não a aceita terá de justificar a sua não aceitação, gerando uma polêmica que continuará dialeticamente a ser condicionada ao fato de que existe - ao menos filosoficamente - algo que se chama metafísica.

Só após a "segunda navegação" platônica é que se pode falar de material e espiritual. E é à luz dessas categorias que os físicos anteriores a Sócrates, e muitos físicos modernos, podem ser tachados e materialistas, mas agora a natureza não pode mais ser vista como a totalidade das coisas que existem, mas como a totalidade das coisas que aparecem.

Como diria o Físico David Bohm, a ordem explícita é apenas consequência de uma ordem implícita, superior e invisível. O "verdadeiro" ser é constituído pela "realidade inteligente" e "inteligível" que lhe é transcendente.

O Mito da Caverna


É o próprio Platão quem nos dá uma ideia magnifica sobre a questão da ordem implícita e explícita no seu célebre "Mito da Caverna" que se encontra no centro do Diálogo A República. Vejamos o que nos diz Platão, através da boca de Sócrates: Imaginemos homens que vivam numa caverna cuja entrada se abre para a luz em toda a sua largura, com um amplo saguão de acesso. Imaginemos que esta caverna seja habitada, e seus habitantes tenham as pernas e o pescoço amarrados de tal modo que não possam mudar de posição e tenham de olhar apenas para o fundo da caverna, onde há uma parede. Imaginemos ainda que, bem em frente da entrada da caverna, exista um pequeno muro da altura de um homem e que, por trás desse muro, se movam homens carregando sobre os ombros estátuas trabalhadas em pedra e madeira, representando os mais diversos tipos de coisas. Imaginemos também que, por lá, no alto, brilhe o sol. Finalmente, imaginemos que a caverna produza ecos e que os homens que passam por trás do muro estejam falando de modo que suas vozes ecoem no fundo da caverna.

Se fosse assim, certamente os habitantes da caverna nada poderiam ver além das sombras das pequenas estátuas projetadas no fundo da caverna e ouviriam apenas o eco das vozes. Entretanto, por nunca terem visto outra coisa, eles acreditariam que aquelas sombras, que eram cópias imperfeitas de objetos reais, eram a única e verdadeira realidade e que o eco das vozes seriam o som real das vozes emitidas pelas sombras.

Suponhamos, agora, que um daqueles habitantes consiga se soltar das correntes que o prendem. Com muita dificuldade e sentindo-se frequentemente tonto, ele se voltaria para a luz e começaria a subir até a entrada da caverna. Com muita dificuldade e sentindo-se perdido, ele começaria a se habituar à nova visão com a qual se deparava. Habituando os olhos e os ouvidos, ele veria as estatuetas moverem-se por sobre o muro e, após formular inúmeras hipóteses, por fim compreenderia que elas possuem mais detalhes e são muito mais belas que as sombras que antes via na caverna, e que agora lhes parece algo irreal ou limitado.

Suponhamos que alguém o traga para o outro lado do muro. Primeiramente ele ficaria ofuscado e amedrontado pelo excesso de luz; depois, habituando-se, veria as várias coisas em si mesmas; e, por último, veria a própria luz do sol reflectida em todas as coisas. Compreenderia, então, que estas e somente estas coisas seriam a realidade e que o sol seria a causa de todas as outras coisas. Mas ele se entristeceria se seus companheiros da caverna ficassem ainda em sua obscura ignorância acerca das causas últimas das coisas. 

Assim, ele, por amor, voltaria à caverna a fim de libertar seus irmãos do julgo da ignorância e dos grilhões que os prendiam. Mas, quando volta, ele é recebido como um louco que não reconhece ou não mais se adapta à realidade que eles pensam ser a verdadeira: a realidade das sombras. E, então, eles o desprezariam....


Qualquer semelhança com a vida dos grandes gênios e reformadores de todas as áreas da humanidade não é mera coincidência.
Trabalho e pesquisa de Carlos Leite Ribeiro - Marinha Grande - Portugal
Imagens captadas no Google Imagens.

3 comentários:

  1. Muito me inspiram os grandes homens da antiguidade.
    Magnífico trabalhos,querido Carlos.
    Grande abraço.

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  2. Excelente texto. Ótimo design do blog...

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  3. Esplêndido trabalho, meu caro amigo Carlos... Esta matéria é um perfeito presente, por falar de homens tão brilhantes, os quais muito contribuíram, para o mundo... Parabéns!!!

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